CENTRO EDUCACIONAL 06 DE CEILÂNDIA
PROF. FRANCISCO A. MIRANDA
C. CURRICULAR: FILOSOFIA
TEMA - O sistema hegeliano e seus contestadores[1]
Atividade Avaliativa de Pesquisa
Observações fundamentais:
01.
[Na primeira linha] - Escreva o seu nome completo sem abreviação, seguido pelo número, série,
turma e turno. (Ex. Francisco Alves de
Miranda, Nº 01, 3º A), em seguida - [segunda linha] - escreva o título do trabalho (caderno) – O sistema hegeliano.
02.
O trabalho é individual e deve ser escrito no caderno (contendo perguntas e respostas).
03.
As perguntas e respostas devem
ser escritas à caneta de tinta cor azul
ou preta. Perguntas de uma cor e
respostas de outra. O valor do trabalho (2,0) dois pontos.
04.
Data
de entrega – [26-30/10/2016].
05.
A entrega do trabalho corresponde
ao dia da Primeira Aula exclusivamente.
06.
Caso esteja impedido de
comparecer a aula, favor apresentar atestado médico correspondente ao dia da
entrega, ou, em último caso, pedir a um familiar ou colega para trazer e apresentar
o seu caderno conforme data prevista.
07.
Todas
as questões devem ser respondidas, caso contrário,
não será aceito (o trabalho).
08.
Observe a quantidade de linhas (não será permitida quantidade
inferior ao número solicitado). Faça a enumeração das linhas. Exemplo: 01, 02, 03 em diante.
09.
Cópias
[trabalhos idênticos] não serão permitidas. Por
garantia não revele sua fonte de pesquisa e, tampouco, partilhe o seu caderno.
As redações serão lidas
em sala.
01 – O sistema hegeliano
“O botão desaparece no florescimento, podendo-se dizer que aquele é
rejeitado por este; de modo semelhante, com o aparecimento do fruto, a flor é
declarada falsa existência da planta, com o fruto entrando no lugar da flor
como a sua verdade. Tais formas não somente se distinguem, mas cada uma delas
se dispersa também sob o impulso da outra, porque são reciprocamente
incompatíveis. Mas, ao mesmo tempo, a sua natureza fluida faz delas momentos da
unidade orgânica, na qual elas não apenas não se rejeitam, mas, ao contrário,
são necessárias uma para a outra, e essa necessidade igual constitui agora a
vida do inteiro” (HEGEL apud COTRIM, 2000, p. 193).
Antes propriamente de falarmos no grande sistema
proposto por Hegel, parece oportuno falarmos do Idealismo (alemão). O Idealismo refere-se a qualquer doutrina que afirme que a
natureza última da realidade é mental. Nesse sentido, ele se opõe ao realismo. Para o idealismo, os objetos físicos não existem a não ser como
objetos para uma mente, ou que são apenas conteúdos mentais. O fundador do idealismo foi o filósofo irlandês
George Berkeley para quem
só existem dois tipos de coisas: mentes e ideias. Os chamados “objetos físicos”
não passam, de acordo com Berkeley, de impressões do sujeito capaz de sentir.
Já em conformidade com Kant, podemos falar de um idealismo transcendental. O que isso significa? Kant admite a
existência de uma realidade independente da mente, mas afirma que dela nada
podemos saber. Nesse sentido Kant é idealismo por defender que o mundo tal como
o conhecemos é o produto das leis que o sujeito impõe aos objetos quando os
percepciona. Os objetos da experiência não são, assim, entidades independentes.
Essas leis fazem parte do que Kant designa como “estrutura transcendental” do
sujeito. Daí o nome por que é conhecido este tipo de idealismo.
Há ainda o idealismo absoluto
defendido por Fichte e Hegel. Para Hegel toda a realidade é expressão do Espírito Absoluto, que toma consciência
de si exteriorizando-se e manifestando-se nos objetos físicos. Para Hegel, “o
mundo é a manifestação da Ideia”.
Agora parece possível o mergulho no sistema hegeliano. Georg Wilhelm
Friedrich Hegel é considerado um dos
maiores filósofos alemão do século XIX. Nasceu em Stuttgart em 1770. A obra de
Hegel é fortemente sistemática procurando incluir em um sistema integrado todos
os grandes temas e questões da tradição filosófica, da ética à estética.
Pode-se dizer também que se trata do último grande sistema filosófico. Depois
de Hegel a concepção de uma filosofia sistemática entra em crise, em grande
parte devido às críticas à pretensão hegeliana feitas ao longo do século XIX
por filósofos como Shopenhauer, Kierkegaard, Marx e Nietzsche, dentre outros.
Hegel tomou como ponto de partida a noção kantiana de que a consciência,
ou seja, o sujeito interfere ativamente na construção da realidade. Ele propõe
o que se pode chamar de filosofia do devir, quer dizer, do ser como processo,
como movimento, como vir-a-ser.
Desse ponto de vista, o ser está em constante transformação, donde surge
a necessidade de fundar uma lógica que não parta do princípio de identidade
estático, mas do princípio de contradição para dar conta da dinâmica do real.
Desta forma, Hegel cria o seu sistema[2].
a)
A dialética
“Chamamos de dialética o movimento racional superior em favor do qual
esses termos na aparência separados (o ser e o nada) passam espontaneamente uns
nos outros, em virtude mesmo daquilo que eles são, encontrando-se eliminada a
hipótese de sua separação” (HEGEL).
Etimologicamente, dialética[3] vem do grego dia (que expressa a ideia de dualidade,
troca) e lektikós (apto à palavra,
capaz de falar), é a mesma raiz de logos (palavra, razão) e, portanto, se
assemelha ao conceito de diálogo. Originariamente, ela significa a arte do diálogo e
da discussão.
A palavra dialética ganhou vários sentidos ao longo da história e, com
Hegel, a coisa não foi diferente. Embora existam pontos de contatos muito
notáveis entre a dialética clássica e a hegeliana, existe também, ao mesmo
tempo, uma diferença essencial, melhor dizendo, os antigos deram grande passo
no caminho da cientificidade, enquanto souberam se elevar do particular ao
universal.
Para Hegel a realidade é devir,
é movimento, logo, dinamismo. Isso implica que para ser instrumento adequado, a
dialética deveria ser reformulada levando em consideração esse dinamismo, sendo
preciso, portanto, imprimir movimento às essências e ao pensamento universal já
descoberto pelos antigos. Dessa maneira, através desse movimento, os puros
pensamentos tornam-se conceitos e somente então são o que verdadeiramente são:
automovimento, círculos, essências espirituais.
Esse movimento das essências puras constitui, em geral, a natureza da
cientificidade e o coração da dialética. Neste sentido, o termo dialética é
utilizado para compreender e exprimir a situação real do mundo. Ela tem uma
clara radicação histórica e concreta, uma vez que exprime, por um lado, a
contradição do mundo existente e, por outro, a necessidade de superar os
limites presentes.
Ela é movida pela exigência de superação e pela necessidade de uma
realização total e de um modo efetivo (em uma organização e estruturação social
e política) da liberdade e da infinitude, noutras palavras, o caráter dialético
do real significa que cada coisa é o que é, e só chega a sê-lo, em interna
relação, união e dependência com outras coisas e, em última análise, com a
totalidade do real. A dialética hegeliana, de maneira simplificada é o jogo de tese, antítese e síntese, ou
seja, o jogo da afirmação, da negação e da negação da negação. Há no pensamento
deste filósofo, uma metáfora ou
alegoria, a dialética do senhor e do escravo.
b)
A dialética do senhor e do escravo
O senhor submete o escravo, contudo, uma vez que a relação é dialética,
dependendo ele próprio de que o escravo o reconheça como senhor, assim o
superior depende de que o inferior o reconheça como superior. Trata-se de um
reconhecimento desigual. Por outro lado, o senhor reconhece implicitamente o
escravo como outra consciência, já que sabe que este não é uma coisa, uma pedra
ou uma árvore, e se dirige a ele como a outro sujeito. O escravo, por sua vez,
na medida em que trabalha, interage com a natureza, “encontra a si mesmo”; “a
consciência trabalhadora”, “chega assim a intuição do ser independente como a
intuição de si mesmo”. Portanto, através do trabalho, o escravo supera sua
condição de “consciência submetida” à do senhor, enquanto que o senhor, na
medida em que depende do conhecimento do escravo e do seu trabalho, se rebaixa
a uma condição inferior. Assim, dialeticamente, as posições se invertem.
Através desta metáfora, Hegel procura retratar o processo de
constituição da identidade da consciência em sua luta pelo reconhecimento do
outro, a outra consciência. Portanto, a dialética do senhor e do escravo
descreve uma relação assimétrica entre duas consciências que se tratam como
sujeito e objeto, e não uma relação entre dois sujeitos, como deveria ser, uma
relação de conhecimento mútuo e recíproco. Só ao atingir o saber absoluto a
consciência será capaz do reconhecimento universal.
c)
O conhecimento
“Reconhecer a razão como a Rosa na cruz do sofrimento presente e dela
fruir é a intelecção racional que reconcilia com a realidade, e que a filosofia
oferece àqueles que já sentiram alguma vez a exigência interior de compreender
e de manter a liberdade subjetiva exatamente naquilo que tem de substancial,
não como algo individual e acidental, mas que é em si e para si” (HEGEL apud
NICOLA, 2005, p. 361).
O que é o conhecimento, a verdade, o real segundo Hegel? A verdade,
nesse contexto, deixa de ser um fato para ser um resultado do desenvolvimento
do espírito. O conhecimento (enquanto estabelecido a partir de uma realidade
dada, imediata, simples aparência) é chamado de conhecimento abstrato, ao qual se opõe o conhecimento do ser real,
concreto, que consiste em descrever o modo como uma realidade é produzida.
Hegel afirma que conhecer a gênese, o processo de constituição pelas mediações
contraditórias, é conhecer o real. Ora, no sistema hegeliano, a racionalidade
não é mais um modelo a se aplicar, mas é o próprio tecido do real e do
pensamento. O mundo é a manifestação da ideia, o “real é racional e o racional
é real”. A “História universal nada mais
é do que a manifestação da Razão”.
Vale salientar que a história não é a simples acumulação e justaposição
de fatos acontecidos no tempo, mas é resultado de verdadeiro engendramento, de
um processo cujo motor interno é a contradição dialética. Dentro dessa
concepção, a razão passa por diversos graus, desde a natureza inorgânica até as
formas mais complexas da vida social. Entre estas, Hegel se refere ao espírito
absoluto, ou seja, o espírito exterior do homem enquanto expressão da vontade
coletiva por meio da moral, do direito e da política: o espírito objetivo se
realiza naquilo que se chama mundo da cultura.
Desta forma, pode-se dizer que a filosofia hegeliana, enquanto
dialética, dá-nos, assim, uma concepção relacional da realidade e concebe a
realidade como um todo, sem que isso em nada afete a relativa independência, de
cada coisa na sua singularidade.
A dialética enquanto expressão da filosofia hegeliana, significa a
radical oposição de Hegel a toda a interpretação fragmentária tanto da
realidade como, por conseguinte, do conhecimento. Vale dizer que a realidade
enquanto dialética é, pois, processual, regida e movida pela contradição,
internamente relacionada (inter-relacional) e constituída como oposição de
contrários, embora se diga que “o verdadeiro é o todo” e o todo é real e o real
é racional.
d)
A Filosofia
“A filosofia não deve imaginar como o mundo deveria ser, mas limitar-se a
explicá-lo. Ela sempre chega depois, quando a realidade já se constituiu, assim
como a coruja de Minerva só levanta voo no crepúsculo, quando o dia já terminou”
(HEGEL apud NICOLA, 2005, p. 354).
A filosofia está intimamente interligada ao movimento dialético, logo,
fazer filosofia é participar desse movimento. A filosofia para Hegel não é
simplesmente pensar sobre a realidade, mas é exprimir a própria realidade
enquanto se desdobra a caminho da síntese do absoluto. Com suas palavras, “é a transparência do espírito em sua
autoposse”. Assim, o pensar do filósofo seria um movimento do próprio ser,
sendo esse concebido como um perpétuo devir. A filosofia, ao produzir-se a si
própria, toma ao natural como seu ponto de partida para superá-lo.
A filosofia começa quando um povo sai da sua vida concreta, quando vão
surgindo divisões e diferenciações nas classes sociais, quando o povo se
aproxima do ocaso, quando se vai cavando um abismo entre as tendências internas
e a realidade externa, e as formas antiquadas da religião já não satisfazem ou,
ainda, quando o espírito se manifesta indiferente pela sua existência real, ou
então, permanecendo nela, só experimenta insatisfação e incômodo, e a sua vida
moral se vai dissolvendo.
A filosofia é a realidade do tempo presente, algo que brota no contexto
histórico e, a partir daí, dá um giro sobre si mesma e dialeticamente vai se
superando na realidade, se bem que a realidade é o próprio tempo presente. Como
diz o filósofo, o que quer que aconteça, cada indivíduo é sempre filho de sua
época; portanto, “a filosofia é a sua época tal como apreendida pelo
pensamento. É tão absurdo imaginar que a filosofia pode transcender sua
realidade contemporânea quanto imaginar que um indivíduo pode superar seu
tempo, saltar sobre Rodes”.
Aqui é oportuno destacar o que é próprio da filosofia: ela não deve
imaginar como o mundo deveria ser, mas limitar-se a explicá-lo. Ela sempre
chega depois, quando a realidade já se constituiu, assim como a coruja de
Minerva só levanta voo no crepúsculo, quando o dia já terminou. A sua tarefa é
meramente interpretativa e foram absurdas as tentativas dos filósofos que
procuraram estabelecer como a realidade deveria ser.
O problema é entender aquilo que é, fazer emergir da realidade o
conteúdo racional, pois a realidade mesma já é por si razão. Portanto, a tarefa
da filosofia é entender aquilo que é, ou seja, a razão. De resto, no que
concerne ao indivíduo, cada um é filho do seu tempo: e a filosofia também é o
seu próprio tempo resumido no pensamento.
e)
O Estado
“O Espírito objetivo é a realização da liberdade na sociedade, e se
manifesta no direito, na moralidade e na eticidade, englobando a família, a
sociedade civil e o Estado. O Estado político é, na filosofia de Hegel, o
momento mais elevado do Espírito objetivo, de forma tal que o indivíduo só
existe como membro do Estado” (HEGEL).
O Estado é a soberania que supera as contradições e rivalidades
existentes no interior da sociedade civil e da família. Tal concepção parece um
tanto com a compreensão do Estado proposto por Aristóteles, claro que com ares
modernos, algo que cheira a Estado absoluto, burguês, totalitário. O Estado
para Hegel é o palco da efetivação do espírito objetivo, justamente por
sintetizar a totalidade dos interesses contraditórios entre os indivíduos.
O pensamento hegeliano é um marco reflexivo não só para a filosofia mas
até mesmo para a concepção do direito e da própria história. Foi, sobretudo,
nos campos da filosofia política e da filosofia do direito que a influência de
Hegel na Alemanha foi marcante, com a famosa distinção entre os “velhos” e os
“jovens” hegelianos, também conhecidos respectivamente como “hegelianos de
direita” e de “esquerda”.
02 – Os contestadores do sistema hegeliano
“O que eu
reconheço como essencial no intelecto eu coloco como existente em Deus; Deus é
aquilo que o intelecto pensa como supremo. Mas exatamente naquilo que eu
reconheço como essencial se revela a essência do intelecto, mostra-se a força
da minha capacidade de pensar” (FEUERBACH - A
Essência do Cristianismo).
a)
O filósofo monotemático
“Deus é uma lágrima de amor derramada no mais
profundo segredo sobre a miséria humana” (FEUERBACH).
Um dos contestadores do sistema hegeliano foi Ludwig Feuerbach (1804 - 1872). Ele recusou o idealismo de Hegel
que se baseava em noções abstratas tais como as de Ideia, Espírito e Razão,
qualificando-o de “especulação vazia”, que não tratava do ser real, das coisas
reais e dos homens concretos e propôs que a filosofia deveria partir do
concreto, do ser humano considerado como um ser natural e social.
Feuerbach vai dizer que verdade é o homem e não a razão abstrata,
verdade é a vida e não o pensamento que fica no papel e encontra no papel a
existência que se lhe atribui. Isso equivale a negar o idealismo, posto que é
somente o extravio do homem concreto. Essa posição filosófica que tem como
ponto de partida o ser concreto é chamada de materialismo. Ora, esse termo
designa, em geral, toda doutrina que atribua causalidade apenas à matéria. Em
todas as formas historicamente identificáveis (em que esse termo não seja
empregado como fins polêmicos), o materialismo consiste em afirmar que a única
causa das coisas é a matéria.
Para Feuerbach, Hegel encostou os fundamentos e as causas naturais, as
bases da filosofia genético-críticas. Mas uma filosofia que encosta a natureza
é vã especulação: é vã, portanto, toda especulação que queira ir além da
natureza e do homem, vã como a arte que quer nos dar algo mais do que a figura
humana e só consegue nos dar figuras grotescas.
A filosofia é a ciência da
realidade em sua veracidade e totalidade, mas o compêndio da realidade é a
natureza (entenda natureza aqui no sentido mais universal da palavra). Ora, os
segredos mais profundos estão ocultos nas mais simples coisas naturais, que a
fantasia especulativa, ansiando pelo além, pisoteia com os pés. A única fonte
de salvação é o retorno à natureza. A natureza não construiu somente a vulgar
oficina do estômago: construiu o templo do cérebro.
Feuerbach foi o que se pode chamar de filósofo monotemático por interessar-se pela investigação de um
único problema, no caso, a religião. Na verdade, ele estava interessado não
tanto no problema da existência de Deus, mas no processo de formação da ideia
de Deus no pensamento humano, e toda a sua filosofia pode ser resumida na
seguinte máxima: “não é Deus quem cria o
homem, mas o homem quem cria Deus”.
a.1.) a essência do cristianismo
“Deus é o optativo do coração humano tornado tempo
presente, ou seja, bem-aventurada certeza, é a despreconceituosa onipotência do
sentimento, é a súplica atendida, o sentimento que se escuta a si mesmo, é o
eco do nosso grito de dor” (FEUERBACH).
Em sua obra “A Essência do
Cristianismo”, pode-se entender melhor o significado dessa máxima onde ele
reduz a teologia a uma antropologia. Para ele, a filosofia não tem a função de
negar ou ridicularizar o grande fato humano que é a religião, pelo contrário,
deve compreendê-lo e o compreende quando se dá conta de que a consciência que o
homem tem de Deus é a consciência que o homem tem de si. Isso significa que o
homem põe as suas qualidades, as suas aspirações e os seus desejos fora de si,
afasta-se, aliena-se e constrói a sua divindade. Conforme Feuerbach, a religião
está no relacionar-se do homem com sua própria essência (nisso consiste a sua
verdade), mas sua essência não como sua e sim como outra essência, separada e
dividida dele, até oposta (nisso consiste a sua felicidade). Em outros termos,
a religião[4] é, portanto, a
projeção da essência do homem. Nesse caso Deus seria o “espelho do homem”.
Tal inversão torna a teologia em mera antropologia, a religião nesta
perspectiva torna-se fato humano, totalmente humano, mesmo que o homem
religioso não tenha consciência do caráter humano do seu conteúdo, mesmo que
não admita que o seu conteúdo seja humano. Em poucas palavras, a religião “é a
revelação solene dos tesouros ocultos do homem, a profissão pública dos seus
segredos de amor”, portanto, antropologia. Em suma, Feuerbach substitui o Deus
do céu por outra divindade, no caso, o homem de carne e de sangue. Nesta
perspectiva, a religião, a moral deve tomar como pressuposto o homem e não mais
Deus. Aqui, o amor já não é a Deus e sim ao homem.
b)
O cavaleiro solitário
“O homem é o único animal que faz sofrer os outros pelo único objetivo de
fazer sofrer. [...] nenhum animal maltrata apenas por maltratar, mas o homem
sim, e isto constitui o caráter demoníaco, muito mais grave do que o
simplesmente animal” (SCHOPENHAUER, 1980, p. 195-197).
Arthur Schopenhauer (1788-1860) é uma figura destoante em meio aos demais filósofos. Poucos
filósofos tiveram em vida tão pouco sucesso quanto ele. Enquanto vivo, pouco
foi o sucesso de suas obras. Sua carreira acadêmica não foi aquilo que se pode
chamar de sucesso, pelo contrário, uma tragédia. Há os que digam que o seu
insucesso deveu-se, em primeiro lugar, às péssimas relações que ele mantinha
com o mundo acadêmico. A Hegel, por exemplo, chamo-o de acadêmico mercenário,
dentre outros insultos.
Contestando a moral kantiana, Schopenhauer diz o seguinte: não tenho
reparo em colocar-me em aberta oposição a Kant, que não reconhece bondade ou
outra virtude que as derivadas da reflexão abstrata e particularmente da noção
de dever e do imperativo categórico, considerando o sentimento de compaixão
como uma debilidade, porém, de nenhum modo, como uma virtude. Para o filósofo,
ao contrário do que pensava Kant, a compaixão é a virtude maior: a compaixão é
esse fato admirável, misterioso, pelo qual se vê a linha de demarcação, que aos
olhos da razão separa totalmente um ser do outro. Só a compaixão é o princípio
de toda justiça livre e de toda a caridade verdadeira.
Para Schopenhauer, o ente que não conhece a compaixão está fora da
humanidade, e essa mesma palavra humanidade é muitas vezes tomada como sinônimo
de compaixão. Ele diz mais: a compaixão, princípio de toda a moralidade, toma
também os animais sob a sua proteção, ao passo que os outros sistemas de moral
europeia têm para com eles pouquíssima responsabilidade e solicitude. A compaixão
com os animais está intimamente ligada com a bondade de caráter que se pode
afirmar que quem é cruel com os animais não pode ser bom.
O princípio compaixão, deste ponto de vista, é extraordinário, uma vez
que contempla não só o semelhante, mas todos os seres vivos, toda a realidade
cósmica. Hoje, mais que nunca, o mundo e nele, o ser humano, encontra-se como
que perpetuamente ameaçados. Isto sem levar em consideração o fato de que o
indivíduo (humano) está configurando o seu viver de forma individualista. Como
diz o filósofo, o homem seduzido pela ilusão da vida individual, escravo do
egoísmo, só vê as coisas que o tocam pessoalmente e encontra aí motivos
incessantemente renovados para desejar e quere.
A saída, segundo Schopenhauer, reside na compaixão, pois, aquele que
penetra a essência das coisas, que domina o conjunto, chega ao repouso de todo
o desejo e de todo o querer. Daí em diante a sua vontade desvia-se da vida,
repele com susto os gozos que a perturbam. O homem chega então ao estado de renúncia
voluntária, da resignação, da tranquilidade verdadeira e da ausência absoluta
de vontade.
O autêntico fundamento da ação ética é sem dúvida, a compaixão. É ela a
grande virtude, ela é algo intuitivo, melhor, sensível que faz conhecer nos
outros a nossa mesma essência. É destituída de interesses, é gratuita e
amorosa. Para o filósofo, fortaleza é, sem dúvida, agir de compaixão para com o
próximo. Ora, agir de compaixão para com o outro é deixar-se ser envolvido nas
condições existenciais do outro, é simplesmente entregar-se de coração ao
outro.
b.1.) sua visão sobre o homem e o mundo
“O homem seduzido pela ilusão da vida individual,
escravo do egoísmo, só vê as coisas que o tocam pessoalmente e encontra aí
motivos incessantemente renovados para desejar e querer” (SCHOPENHAUER)
A visão do filósofo acerca do mundo e do próprio ser humano é incomum,
isto é, se for tomado como referência à visão comum, ou seja, o cidadão comum.
Nas Dores do Mundo, o autor deixa entrever a sua visão: para alguns, o mundo é
inferno, trabalho, tormenta, dor, desgosto e miséria.
A vida do homem é um combate perpétuo. Além disso, o ser humano é um
egoísta: a vida do homem oscila, como um pêndulo, entre a dor e o tédio, tais
são na realidade os seus últimos elementos. Sentimos a dor, mas não a ausência
da dor; sentimos a inquietação, mas não a ausência da inquietação.
Segundo Schopenhauer, tanto o animal quanto o ser humano é movido pelo
egoísmo, por uma vontade cega e irrefreável, por ímpeto para a existência e o
bem estar: todas as ações tanto dos animais quanto do ser humano surgem, via de
regra, do egoísmo. Este por sua vez é sem limites: a essência dos animais e do
ser humano é querer e aspirar inextinguivelmente. Trata-se da luta pela
conservação incondicional de sua existência: ou luta para manter-se vivo ou
morre fatalmente.
O ser humano viver abandonado a si mesmo, incerto de tudo, imerso na
indigência e no anseio, ameaçado por perigos sempre renovados: a mais das vezes
a vida nada mais é do que luta contínua pela existência, com a certeza da
derrota final. A vida é mar semeado de escolhos e sorvedouros e até aquele que
consegue sobreviver nada mais faz do que aproximar-se pouco a pouco do grande,
fatal, inevitável e irremediável naufrágio, sabendo que sua vida é velejar em
direção ao naufrágio, rumo à morte, último passo da penosa viagem, meta mais
terrível do que os escolhos evitados.
A vida é compreendida enquanto realidade de necessidade e dor. Se a
necessidade é satisfeita, diz Schopenhauer, então o ser humano mergulha na
saciedade e no tédio, pois o fim, em substância, é ilusório: com a posse,
desvanece todo atrativo; o desejo, porém renasce de nova forma e, com ele, a
necessidade; caso contrário, eis a tristeza, o vazio, o tédio, inimigos ainda
mais terríveis do que a necessidade. Segue-se daí que se o ser humano é por
natureza egoísta, violento, logo não é digno de admiração, no mínimo, de
compaixão. É a compaixão que reinvente esta natureza egoísta em solidariedade,
proximidade e amor.
Mas, será a vida humana uma contínua luta por fadiga, trabalho e
infelicidade? Em conformidade com Schopenhauer a felicidade não é algo real e,
sim, a dor. A infelicidade é que é real, ou seja, a norma, algo que perpassa
todo o viver humano. Ainda dentro desse horizonte reflexivo, como se libertar
da dor e do tédio que tão bem caracteriza o existir humano? Quando o ser humano
mergulha na sua interioridade e descobre a sua essência, ele pode deixar de
querer e, assim, começa a sua redenção. O ser humano só pode libertar-se da dor
e do tédio e subtrair à cadeia infinita das necessidades mediante a arte e a
ascese.
O ser humano em um processo de ascese renuncia a sua própria vontade de
viver e se faz compaixão em todo viver. A caridade é o princípio ético. A
misericórdia é o lançar-se vista sobre a realidade de dor do outro e se ver
enquanto realidade de dor. É a dor, a miséria que nos irmana, que nos torna
iguais e consequentemente, solidários.
Ora, estabelecer a compaixão enquanto princípio ético, enquanto
realidade norteadora da ação humana é algo extraordinário porque torna o ser
humano solidário e menos egoísta. Aqui a razão do viver passa pela constatação
da dor, do sofrimento, da angústia e se concretiza no ato de compaixão para com
todo o viver, uma vez que todo ser vivo necessita da compaixão.
c) O materialismo dialético e
histórico
O leão e a gazela
“Toda manhã, na África, uma gazela desperta. Sabe que deverá correr mais
depressa do que o leão ou será morta. Toda manhã, na África, um leão desperta.
Sabe que deverá correr mais do que a gazela ou morrerá de fome. Quando o sol
surge, não importa se você é um leão ou uma gazela: é melhor que comece a
correr” (MASI, 2006, p. 31-32).
Para entender o materialismo[5] e de modo especial, o dialético, faz-se necessário entender primeiro o que seja matéria. Matéria é aquilo, seja o que for, que
tem existência física e ocupa espaço; que tem forma, tamanho e se pode mover.
Muitos filósofos sintetizam, dizendo que os objetos materiais são substâncias
que têm extensão, mas os cientistas têm levantado muitas dúvidas acerca da
noção tradicional de matéria. Algumas formas de idealismo negam a existência de objetos materiais e algumas
formas de materialismo defendem que só há objetos materiais.
No que diz respeito ao materialismo
histórico proposto por Marx (ou seja, a sua ideia sobre evolução
histórica), pode ser sintetizado do seguinte modo[6]. Já no que diz respeito ao
materialismo dialético[7].
O filósofo alemão Karl Marx
(1818-1883) é, provavelmente, um dos pensadores que maior influência exerceu
sobre a filosofia contemporânea. Ele é um forte opositor do sistema hegeliano.
Para ele há alguns limites nesse sistema, como por exemplo, a compreensão do
ser humano enquanto razão: o homem equivale para Hegel, a autoconsciência.
Outra crítica passa pela compreensão da história que seria regida pelo Espírito
(sujeito da história) progressivo na realização da liberdade.
Marx critica a concepção da realidade (sócio-político-econômica)
enquanto racional (o real é racional) que possibilita a plena realização do ser
humano: essa realidade racional libertadora proposta por Hegel é, na verdade
pura “maquiagem”, ou seja, falsidade. Em tal realidade reside a injustiça ou a
opressão e não a libertação. Aqui, o papel do Estado serve mesmo para legitimar
as estruturas opressoras.
Quanto a concepção de filosofia proposta por Hegel, ela é reflexão
puramente especulativa pois reproduz a realidade na ordem do discurso; ela
chega sempre tarde. Ora tal concepção nada mais é, senão uma forma de ideologia
e, enquanto tal está a serviço do Estado e esse por sua vez, a serviço dos
grupos dominantes, ou seja, da burguesia. Nesse sentido, Marx propõe a
superação da filosofia, melhor, desse modelo filosófico, uma vez que essa
postura já é uma atitude filosófica.
Para ele, a filosofia deve ser práxis: os pressupostos com os quais
começamos não são arbitrários, nem dogmas, são pressupostos reais dos quais só
é possível abstrair na imaginação. Os nossos pressupostos são os indivíduos
reais, a sua ação e as suas condições materiais de vida. Segundo Marx, Hegel
inverte a relação entre o que é determinante, ou seja, a realidade material e o
que é determinado, quer dizer, as representações e conceitos acerca dessa
realidade.
Neste caso, a filosofia idealista seria, assim, uma grande mistificação
que pretende entender o mundo real, concreto, como manifestação de uma razão
absoluta. Contrapondo sua filosofia ao idealismo de Hegel, Marx diz que os
pressupostos com os quais começamos não são arbitrários, nem dogmáticos, são
pressupostos reais dos quais só é possível abstrair na imaginação.
Para Marx, os homens fazem a história que se torna uma totalização
dialética de suas ações. Como sujeitos da história, criam as relações sociais,
engendram novas estruturas econômicas, são responsáveis pelo desenvolvimento e
pelo progresso das forças produtivas. Enfim, tudo o que compõe a história é
fruto das ações dos homens, produto de sua atividade prática, causa de seu agir
dialético que tudo transforma.
Marx pergunta: que é a sociedade, qualquer que seja a sua forma? É o
produto de ação recíproca dos homens. São os seres humanos que produzem as
relações sociais no que diz respeito à sua produção material, criam também as
ideias, as categorias; isto é, as expressões ideais, abstratas, dessas mesmas
relações.
A concepção da história, portanto, se funda sobre o processo real da
produção, e precisamente partindo da produção material da vida imediata,
assumir como fundamento de toda a história a forma de relação que é conexa com
este modo de produção e que por ele é gerada, isto é, a sociedade civil nos
seus diversos estágios, seja representando-a na sua ação como Estado, seja
explicando como base neste todas as várias criações teóricas (as formas da
consciência, religião, filosofia ou moral).
Dentro desse horizonte reflexivo é possível compreender o lado positivo
da filosofia hegeliana (Engels chama de lado revolucionário) na proporção em
que a realidade (racional) é vista enquanto um desenvolvimento dialético. Ora,
sendo a realidade dialética, é também dialética a natureza e o método do saber
c.1.) dialética material marxista
“Marx e Engels colocam o idealismo de Hegel de
cabeça para baixo. Em primeiro lugar vem a natureza, depois o homem, que
transforma através do trabalho. Marx afirma que “não é a consciência dos homens
que determina seu ser, mas ao contrário, é o seu ser social que determina sua
consciência”. A dialética supõe que tudo se relacione, tudo se transforme e a
contradição seja interna e inovadora” (HEERDET, 2003, p. 242)
O conceito marxiano de dialética não só é fundamentalmente diferente do
método de Hegel, como é até a antítese
total dele: para Hegel o processo do pensamento, que chega a converter
inclusive em sujeito com vida própria, sob o nome de ideia, é o demiurgo do
real, que por sua vez é forma externa em que se corporifica.
Para Marx, pelo contrário, o ideal é só o material transferido e traduzido para a cabeça do homem. O que
acontece, em conformidade com Marx é que a dialética, no caso, a hegeliana
aparece invertida, de ponta cabeça. É só, então, virá-la, ou melhor, pô-la em
pé e descobrir-se-á logo, sob a capa mística a semente racional.
Quanto às categorias de “imediatez
- mediação” Marx nega que a realidade se apresenta como “imediato”, como
resultado de uma ação produtiva mediadora. Segundo o filósofo, a natureza é
originária, e, portanto, algo de imediato.
Quanto à categoria de “totalidade”,
trata-se da totalidade natural/social, a totalidade material que é a produção
da vida: a totalidade da sociedade de classes. Essa totalidade encerra uma
“negatividade”, ou seja, um caráter contraditório, mas a contradição é
precisamente uma contradição real, e não meramente lógica, contradição essa que
pressupõe a transformação da estrutura e da ordem real contraditória, e a
instauração de uma outra nova.
Marx concebe a natureza desde o princípio em categorias sociais, em
matéria social, em produção material, mediada e transformada por atividade
social humana. Assim, o materialismo de Marx consiste em considerar a realidade
como o processo dialético real de produção, um processo material (e não
“espiritual”), isso é como trabalho ou ação produtiva do homem em e com a
natureza.
Aqui a história é a história da natureza e a história da humanidade
condicionadas reciprocamente. Portanto, a dialética material marxista é uma
dialética histórica e o “materialismo”
(é “materialismo histórico”). Dentro
desse horizonte reflexivo, pode-se dizer que o mundo não é uma realidade
estática e, sim, dinâmica. É um complexo de processos.
Decorre que a abordagem da realidade só pode ser feita de maneira
dialética, que considera as coisas na sua dependência recíproca, e não linear.
Aqui o materialismo histórico não é mais do que a aplicação dos princípios do
materialismo dialético ao campo da história. E, como o próprio nome indica, é a
explicação da história por fatores materiais.
É oportuno distinguir o materialismo marxista, que é dialético, do
materialismo anterior a ele, conhecido como materialismo
mecanicista[8].
Ampliando à reflexão, pode-se dizer, embora de maneira rotulada, que o
marxismo é filosofia da práxis, entendida aqui enquanto transformação do mundo,
pelo fato de que o ser humano é um ser prático. O que a pessoa é, depende
exclusivamente das circunstâncias materiais da vida social e econômica, que
determinam as suas ideias, a sua consciência.
Aqui, a atividade produtiva (o trabalho) é um dos elementos essenciais
da vida social, que eleva o homem sobre a natureza exterior, para
transformá-la. A partir dessa transformação, o ser humano encontra a sua
“natureza real”. Vale ressaltar que, uma das teses fundamentais da concepção
marxista sobre a práxis, como atividade produtiva, é a transformação do ser
humano e do mundo pelo trabalho.
A práxis material, consequentemente, no pensamento marxista, converte-se
em categoria econômico-filosófica central para explicar a relação entre sujeito
e objeto, em vista de que a pessoa se autoproduz, à medida que produz um mundo
humano e nele se objetiva. Isso quer dizer que a antropologização da natureza e
do objeto se realiza pela práxis.
A natureza perde seu estado de natureza em si para transformar-se em
natureza humanizada. A pessoa a submete, mediante o trabalho, para modelá-la em
conformidade com o seu mundo humano. O chão de efetivação do ser humano em
conformidade com Marx é o mundo da práxis: o ser humano interage com o meio
através de suas relações, através do trabalho. É pelo trabalho que o ser humano
efetiva o seu ser. Vale dizer que, não um trabalho qualquer, mas, aquele que
possibilita ao trabalhador se apropriar dignamente dos bens produzidos pela sua
força produtiva (superação da luta de classes).
d) A transgressão como
filosofar
“O que o verdadeiro filósofo quer dos seus
discípulos. Sozinho vou agora, meus discípulos! Também vós, ide embora, e
sozinhos! Assim quero eu. [...] O homem do conhecimento não precisa somente
amar seus inimigos, precisa também odiar seus amigos. Paga-se mal a um mestre,
quando se continua sempre a ser apenas o aluno. E por que não quereis arrancar
minha coroa de louros? Vós me venerais, mas, e se um dia vossa veneração se
desmoronar. Guardai-vos que não vos esmague uma estátua! [...] Ainda não vos
havíeis procurado: então me encontrastes. Assim fazem todos os crentes, por
isso importa tão pouco toda crença. Agora vos mando me perderdes e vos
encontrardes; e somente quando me tiverdes todo renegado eu retornarei a vós.
[...]” (NIETZSCHE, 1994, p.375).
Friedrich Nietzsche (1844 - 1900) é um pensador intrigante e provocativo em seu modo de
conceber a realidade e a existência humana. Logo, refletir filosoficamente em
conformidade com este pensador pressupõe, pelo menos, desarmar-se de certos
conceitos. O filósofo quando lança o convite a cada pessoa a parir as suas
próprias ideias, tem a intenção de provocar, almejando a autenticidade de cada
pessoa. E, como se sabe, isso é uma tarefa árdua, ser original frente à
tradição filosófica.
Parece que o caminho seguro deveria ser o de se deixar ser guiado pela
segura tradição. Parece mas não é. Na prática, nem caminho há uma vez que é a
pessoa que paulatinamente vai moldando o caminhar, caminho esse que é pessoal e
intransferível. Conforme Nietzsche:
“Nós filósofos temos, constantemente, de parir nossos pensamentos de
nossa dor e, maternalmente, transmitir-lhes tudo o que temos em nós de sangue,
coração, fogo, prazer, paixão, tormento, consciência, destino, fatalidade.
Viver assim se chama para nós, transmudar constantemente tudo o que nós somos
em luz e chama; e também tudo o que nos atinge; não podemos fazer de outro modo”.
Um dado que pode ser perceptível no pensamento de Nietzsche é o elemento
dor. Para o filósofo, esse elemento é a marca da vida humana. Ela ajuda no
amadurecimento. Não há dor maior do que se deparar com a própria finitude:
história, experiência, práxis de vida, desfecho final, fatal, a morte. Aqui a
morte parece ser a única certeza do desfecho final do vivente. Além disso, ela
iguala à humanidade e também a todas as formas de vida existentes.
O curioso da história humana é que ela alimenta uma esperança para a
além-morte, uma espécie de vida aperfeiçoada ou degradada (com Deus ou com o
Diabo). Poucos são aqueles que não se projetam para a além-morte,
contentando-se com a pura finitude humana. Ora, dar-se conta de que é a única
consciência consciente é algo extraordinário, agora, dar-se conta da
mortalidade de tal consciência é algo profundamente angustiante, e mais, de que
não há um para-além é assustador. Como lidar com esse paradoxo? O filósofo
sugere algo, uma espécie de apoio à humanidade que é o companheirismo dos
humanos, o respeito à vida de uma forma geral:
“Uma luz se acendeu para mim: é de companheiros de viagem que eu
preciso, e vivos – não de companheiros mortos e cadáveres, que carrego comigo
para onde eu quero ir. Mas é de companheiros vivos que eu preciso, que me sigam
porque querem seguir a si próprios – e para onde eu quero ir”.
Nietzsche ressalta a importância do companheirismo, ou seja, de iguais
na árdua caminhada humana. Todo ser humano precisa traçar os seus objetivos, as
suas escolhas, o seu caminhar e, esta é uma tarefa insubstituível: a história é
uma experiência intransferível, todavia, não é um ato isolado e, sim, um
acontecimento humano. Nesse horizonte reflexivo, ser discípulo (conforme
Nietzsche) é ser autêntico, livre, construtor de sua própria história, assim
como o mestre que é livre e consciente e segue seu próprio caminho.
d.1. O papel do filósofo: transgredir os valores
estabelecidos
“Desgarrar muitos do rebanho: _ Foi para isto que eu vim. Devem
vociferar contra mim povo e rebanho: rapinate quer chamar-se Zaratustra para os
pastores. Pastores digo eu, mas eles se denominam os bons e justos. Pastores
digo eu: mas eles se denominam os crentes da
verdadeira crença. _ Vede os bons e justos! Quem eles odeiam mais? Aquele que
quebra suas tábuas de valores, o quebrador, o infrator - mas este é o criador.
_ Vede os crentes de toda a crença! Quem eles odeiam mais? Aquele que quebra
suas tábuas de valores, o quebrador, o infrator - mas este é o criador” (NIETZSCHE, 1983, p. 228).
Essas máximas se tomadas como normativas para o viver humano são
difíceis de compreensão. Aparentemente é um convite a desvalorização do valor,
ou seja, da norma instituída, é a criação do seu próprio valor. Imagine que o
valor que alguém instituiu para o seu viver seja precisamente contrário ao do
resto da humanidade, como, então seria possível o convívio social?
Pensar positivamente uma postura ética a partir deste ponto de vista é
um tanto complexo. Mas, essa concepção ética de cunho universal (e dominador)
parece ser posta em cheque por Nietzsche. Para ele a moral dos dominantes é que
é imoral e, não, a sua transgressão[9].
Não será por ventura essa perspectiva de futuro com a quebra dos valores
instituídos, um tanto duvidosa, pois quem sobressairia aos valores? Os fortes!
Os fracos seriam simplesmente o fracasso, o fiasco histórico, o peso morto da
história, somente os fortes dentre os fortes, melhor, o mais forte de todos,
precisamente, o super-homem ou uma supernação
sobressairia.
Por um lado, aceitar a moral tal como ela nos é dada é aceitar os
preceitos instituídos pelos dominadores; por outro lado, transgredir todos os
valores é impossibilitar a vivência entre as pessoas. O ideal parece, portanto, mudança processual. Todavia, o filósofo não
comunga com essa ideia[10].
Nietzsche desconfiar do ar da planície comum dos mortais: “de uma longa
experiência que me foi dada por tal andança pelo proibido, aprendi a considerar
as causas pelas as quais até agora se moralizou e idealizou, de modo muito
diferente do que seria desejável: a história escondida dos filósofos, a
psicologia de seus grandes nomes, veio à luz para mim”. Frente a isso, pode-se
concluir que ele é o grande medidor do valor, no caso, do seu valor.
Para Nietzsche, o filósofo é aquele ser que se distancia (de uma maneira
reflexiva) da sociedade para melhor compreendê-la. É aquele que sobe a montanha
e de lá, além de respirar o ar puro, é capaz de perceber toda a realidade a sua
volta e de não aceitar as coisas como foram dadas. Talvez seja esse também o
intento de sua filosofia: provocar, instigar o leitor a gestar suas próprias
ideias, a elaborar um pensamento genuinamente seu.
Em suma, o pensamento de Nietzsche é provocativo, destoante da ideia
comum de muitos pensadores. No entanto, não é possível filosofar simplesmente
com a repetição de ideias de filósofos passados. Os grandes filósofos são
importantes, entretanto, servem como uma referência e não como um fator
decisivo da sua reflexão. Fica, então, o conselho do filósofo: que cada ser
caminhe com os seus próprios pés.
Atividades propostas:
Texto 01: “A filosofia não
é senão o pensamento em movimento progressivo. [...] Falar de numerosas
filosofias significa dizer que são os graus necessários ao desenvolvimento da
razão que se torna consciente dela mesma, do Uno. [...] Só há uma razão, não há
uma segunda super-humana. A filosofia é a razão que se aprende na forma do
pensamento que se torna consciente de modo a objetivar-se, a conhecer-se na
forma do pensamento” (HEGEL, 1980, p. 75).
01. O que significa o idealismo alemão? Pesquise a respeito e responda em (05-07 linhas obrigatórias).
02. O que significa o termo dialética?
Que sentido davam os gregos para a dialética? Qual o sentido proposto por
Hegel? A sugestão para esta atividade consiste em trabalhar a metáfora do
senhor e do escravo (a dialética hegeliana). Elucidar os reais limites do
senhor e do servo e os por quês de cada um ser limitados. A partir dessa
experiência, apontar saídas. Estabeleça a sua crítica (de forma dissertativa e
argumentativa em 25-30 linhas obrigatórias -
faça a contagem de linhas).
03. Após a leitura do texto supracitado, responda: o que é filosofia em
conformidade com Hegel? Você está de acordo com essa definição, ou seja, o que
é filosofia para você? Comente sua resposta em 10-15 linhas obrigatórias – faça
a contagem das linhas).
Texto 02: Deus é o eco do nosso grito
de dor
“Deus é o optativo do coração humano tornado tempo presente, ou seja,
bem-aventurada certeza, é a despreconceituosa onipotência do sentimento, é a
súplica atendida, o sentimento que se escuta a si mesmo, é o eco do nosso grito
de dor. O sentimento deve extrinsecar-se: inconscientemente, o artista toma do
alaúde para desafogar na música o seu próprio sofrimento. Ele aplaca sua dor no
ouvi-la, no objetivá-la; alivia o peso do seu coração comunicando-o,
transformando a sua dor em dor universal. Mas a natureza não escuta os lamentos
do homem, é insensível aos seus sofrimentos. Por isso, o homem foge da
natureza, das coisas visíveis, refugiando-se no seu próprio íntimo, para aqui
encontrar quem escute o seu próprio sofrimento. É aqui que ele expressa os
segredos que o sufocam, é aqui que ele alivia o seu próprio coração oprimido.
Esse conforto do coração, esse segredo que pôde se revelar, esse sofrimento que
pôde se expressar, isto é Deus. Deus é uma lágrima de amor derramada no mais
profundo segredo sobre a miséria humana” (FEUERBACH apud REALE e ANTISERI,
1991, p. 173-174).
04. Em conformidade com o texto acima, quem é Deus,
como nasce a ideia de Deus? Explique. Observe a seguinte frase: “toda imagem de
Deus descreve uma qualidade humana ao infinito”. Será Deus simplesmente um
atributo humano? Disserte de forma argumentativa sobre o assunto (25-30
obrigatórias).
Texto 03: O Fenômeno
religioso
“Em suas relações com as ideias religiosas, a razão
consciente deve apenas destruir uma ilusão. Uma ilusão, porém, que está longe
de ser inócua, porque exerce sobre o homem uma influência fundamentalmente
perniciosa e funesta, que destrói as suas forças para a vida real e lhe faz
perder o sentido da verdade e da virtude. De fato, o próprio amor, sentimento
em si mais verdadeiro, é corrompido pela religião e transformado em um
sentimento puramente aparente e ilusório; o amor religioso não ama o homem
senão por amor de Deus, ou seja, ama o homem só aparentemente, na realidade ama
a Deus [...]. A religião é a cisão do homem consigo mesmo: ele se põe diante de
Deus como um ser contraposto. Deus não é o que é o homem, o homem não é o que
Deus é. Deus é o ser infinito, o homem é o ser finito; Deus é perfeição, o
homem imperfeito; Deus é eterno, o homem temporal; Deus é onipotente, o homem
impotente; Deus é santo, o homem pecador. Deus e o homem são extremos: Deus é o
polo positivo, a soma de todas as realidades, o homem é o pólo negativo, a soma
de todas as nulidades. Mas o homem tem como objeto, na religião, o seu ser
oculto. Deve-se, portanto, demonstrar que essa antítese, essa desarmonia entre
Deus e o homem, onde a religião tem origem, é uma desarmonia do homem com o seu
próprio ser. A íntima necessidade dessa demonstração resulta do fato de que se
realmente o ser divino, o objeto da religião, fosse algo diferente do ser do
homem, não poderia realizar-se uma cisão, uma desarmonia. Se realmente Deus é
um outro ser, o que me importa a sua perfeição? Cisão só existe entre seres que
estão em discordância entre si, mas devem constituir um único ser; podem sê-lo
e, em consequência, essencialmente são realmente um só ser. Portanto, já a
partir desse princípio geral, deve resultar que o ser, do qual o homem se sente
cindido, é um ser que lhe é inato, mas ao mesmo tempo um ser de natureza
diversa, como o ser ou o poder que lhe dá o sentimento, a consciência da
conciliação, da unidade de Deus ou, o que forma um todo, consigo mesmo. Esse
ser não é nada mais que a inteligência, a razão ou o intelecto. Deus, concebido
como extremo oposto do homem, não como um ser humano – ou seja, pessoalmente
humano -, é o ser objetivado do intelecto. O ser divino, puro, perfeito,
desprovido de defeitos é a autoconsciência do intelecto, a consciência do
intelecto da própria perfeição. O intelecto não conhece os sofrimentos do
coração: não tem desejos, paixões, necessidades e justamente por isso, nenhuma
deficiência ou fraqueza, como o coração” (FEUERBACH apud NICOLA, 2002, p. 369).
Para refletir
05. Será realmente a religião uma ilusão perniciosa,
uma alienação ou uma patologia do espírito humano? Será a onipotência de Deus a
projeção ao infinito da autossuficiência da razão humana? Disserte de forma
argumentativa sobre esse pensamento (25-30 linhas obrigatórias).
Texto 04: A compaixão
“Só a compaixão é o princípio de toda a justiça livre e de toda a
caridade verdadeira. A compaixão é um fato incontestável da consciência do
homem; ela é essencialmente própria e não depende de noções anteriores, de
ideias a priori, religiões, dogmas,
mitos, educação e cultura. É o produto espontâneo, imediato, inalienável da
natureza, resiste a todas as provas e mostra-se em todos os tempos e em todos
os países. Em toda a parte é invocada com confiança, tão grande é a certeza de
que ela existe em todos os homens. [...] O ente que não conhece a compaixão
está fora da humanidade. [...]” (SHOUPENHAUER, 2001, p. 122).
06. O que é compaixão? Em conformidade com o texto, o
que faz com que a compaixão se torne mais significativo do que a religião, a
educação e a própria cultura? Pode-se dizer que a compaixão é o princípio de
toda ética? Dê o seu ponto de vista de forma argumentativa e dissertativa
(25-30 linhas obrigatórias).
Texto 05: Quanto à Alienação do
Trabalho
“A aranha realiza operações que se assemelham às do tecelão e a abelha
envergonha muitos arquitetos com a construção de suas casinhas de cera. Mas o
que desde o princípio distingue o pior arquiteto da melhor abelha é o fato de
que ele construiu a casinha em sua cabeça antes de construí-la de cera. No fim
do processo de trabalho, emerge resultado que no início já estava presente na
ideia do trabalhador e que, portanto, já estava presente idealmente. Não que
ele efetue somente a mudança de forma do elemento natural” (MARX apud REALE e
ANTISERI, 1991, p. 193).
07. Qual a diferença entre a atividade humana e
atividade animal? Tem a ver com o trabalho? O que é alienação no mundo do
trabalho? Justifique sua resposta (05-07 linhas obrigatórias).
Texto 06: O leão e a gazela
“Falemos claro desde o início: por mais que o trabalho enobreça o homem,
tornando-o livre e seguro, ainda assim não se pode dizer que a maioria das
pessoas – camponeses e operários mas também gerentes e executivos – tenha
(enquanto trabalha) uma cara alegre.
Antepor sistematicamente a quantidade de produtos à
felicidade dos produtores é um crime que a atual organização do trabalho, que
mais ou menos copia a das empresas industriais, comete com imprudente
frequência. Podem ser movidas muitas peças de acusação.
Primeira acusação: as organizações produtivas
fabricam infelizes porque constrangem os seus dependentes a serem (ou pelo
menos parecerem) eficientes e competitivos a todo custo.
Observem-se os textos ostentados em muitos
escritórios: à primeira vista pareceriam engraçados, mas tem o mesmo efeito que
instigações a delinquir. Vejam-se este: “Toda manhã, na África, uma gazela
desperta. Sabe que deverá correr mais depressa do que o leão ou será morta.
Toda manhã, na África, um leão desperta. Sabe que deverá correr mais do que a
gazela ou morrerá de fome. Quando o sol surge, não importa se você é um leão ou
uma gazela: é melhor que comece a correr”. Conheço um diretor da Telecom tão
entusiasta desse apólogo que o distribuiu a todos os empregados.
Se vocês não são de tudo alienados, bastará um
instante de reflexão para entender que uma frase do gênero, talvez adequada
para anunciar calçados esportivos, se utilizada numa empresa como pensamento
edificante transforma-se numa infeliz exaltação daquela guerra bárbara de todos
contra todos que as empresas chamam de competitividade e que atiçam dia e
noite, dentro e fora, a nível local e global. Não é por acaso que a metáfora
tem como cenário a floresta africana e feras como protagonistas.
Trata-se de uma guerra sádica em que cada um, tão
logo conquista uma migalha de poder, sente-se um leão autorizado a agarrar
gazelas. É uma guerra masoquista na qual cada um, na presença do chefe,
sente-se uma gazela mantida para ser dilacerada pelo leão. É uma guerra
estúpida, porque, na hierarquia empresarial, cada um é chefe de algum
funcionário e está submetido a algum chefe: cada um, portanto, é obrigado a
cindir-se, a desdobrar-se, a ficar esquizofrênico, brincando de esconder
consigo mesmo, açulando o leão prepotente para que entre a fim de acossar a
gazela inerme que lá se encontra.
Essa guerra ridícula e perigosíssima, que em cada
empresa estimula o instinto felino à violência, que premia a agressividade, que
faz de cada gerente um punk ambíguo, essa guerra inútil e, por fim, danosa para
todos devasta o sentido de solidariedade, o hábito das boas maneiras, a doçura
das relações humanas, a estética dos lugares e o tempo de vida” (MASI, 2006, p.
31-32).
Para refletir
08. Qual é o sentido de trabalho proposto por Domenico
de Masi? Em sua opinião, a crítica que ele faz a competitividade procede, ou
seja, faz sentido? Disserte de forma argumentativa sobre o assunto (25-30
linhas obrigatórias).
Texto 07: O anúncio da “morte de
Deus”
“Na Gaia ciência, o homem louco anuncia aos homens que Deus está morto:
“O que houve com Deus? Eu vos direi. Nós o matamos – eu e vós. Nós somos os
seus assassinos!” Pouco a pouco, por diversas razões, a sociedade ocidental foi
se afastando de Deus: foi assim que o matou. Mas, “matando” Deus, eliminam-se
todos os valores que serviram de fundamento para a nossa vida e,
consequentemente, perde-se qualquer ponto de referência: “O que fazemos
separando a terra do seu sol? Para onde vai ela agora? Para onde vamos nós,
longe de qualquer sol? Não continuaremos a nos precipitar para trás, para os
lados e para frente? Ainda existem um alto e um baixo? Não estaremos talvez
vagando por um nada infinito? [...] Deus está morto! Permanece morto! E nós o
matamos!”
Para Nietzsche, nós eliminamos o mundo do sobrenatural, mas, assim
fazendo, infringimos também o quadro dos valores e ideais a ele ligados. E,
assim, nos encontramos sem ponto de referência: nós matamos Deus e com ele
desapareceu o homem velho, mas o homem novo ainda não apareceu. Diz o louco em
Gaia ciência: “Venho cedo demais, ainda não é o meu tempo. Esse acontecimento
monstruoso ainda está em curso e não chegou aos ouvidos dos homens” (REALE e
ANTISERI, 1991, p. 430-431).
Para refletir
09. Filosofar é mais que ler e interpretar um texto, é
mais que contextualizá-lo, é posicionar-se reflexiva e criticamente perante tal
texto e o seu contexto existencial, é encarná-lo e assumi-lo como seu, assim
como o sangue que corre em suas veias. Diante disso, qual é o seu parecer
perante a reflexão feita por Nietzsche, no que diz respeito à trajetória da
vida humana, da moral, religião, de Deus? Disserte de forma argumentativa sobre
essas questões (25-30 linhas obrigatórias).
Texto 08: O super-homem é o
sentido da terra
“A mensagem fundamental de Zaratustra, com efeito, está em pregar o
super-homem. “O super-homem é o sentido da terra! Que a vossa vontade proclame:
que o super-homem seja o sentido da terra! Eu vos conclamo, meus irmãos,
permaneceis fiéis à terra e não acrediteis naqueles que vos falam de esperanças
sobrenaturais! [...] Outrora, o delito contra Deus era o maior dos malefícios,
mas Deus está morto [...]. Agora, a coisa mais triste é pecar contra o sentido
da terra! E é o homem, o novo homem, que deve criar novo sentido da terra,
abandonar as velhas cadeias e cortar os antigos troncos. O homem deve inventar
o homem novo, isto é, o super-homem, o homem que vai além do homem e que é o
homem que ama a terra e cujos valores são a saúde, a vontade forte, o amor, a
embriaguez dionisíaca e novo orgulho. Diz Zaratustra: “O novo orgulho
ensinou-me o meu Eu e eu o ensino aos homens: não deveis mais esconder a cabeça
na areia das coisas celestes, mas mantê-la livremente: cabeça terrena, que cria
ela mesma o sentido da terra” (REALE e ANTISERI, 1991, p. 436).
Para refletir
10. Qual a grandeza e o limite desse pensamento
nietzschiano? Comente a respeito (07-10 linhas obrigatórias).
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[1]
MIRANDA, Francisco Alves de; FEITOSA, E. Geralda e; NEVES, W. Silva. Filosofia: alguns dos seus caminhos no
ocidente. São Paulo: Baraúna, 2010.
[2] Este sistema pode ser resumido da seguinte
maneira:
1. Identidade entre
racional e real, em virtude da qual a realidade é tudo aquilo que deve ser, ou
seja, justifica-se absolutamente em todas as suas manifestações, que, portanto,
são “necessárias” no sentido de não poderem ser diferentes daquilo que são.
Deste ponto de vista, contrapor à realidade o “dever ser”, uma norma ou uma
ideia à qual ela não se adequaria, significa simplesmente erigir em juízo da
realidade o intelecto finito (o interesse ou o arbítrio do indivíduo humano), e
não a razão;
2. Interpretação da
necessidade racional em termos de processo dialético, entendendo-se por
dialético a síntese dos opostos;
3. Reconhecimento,
como termo último desse processo, de uma Autoconsciência absoluta, que também
será chamado pelos partidários de Hegel de Espírito, Conceito Puro, Consciência
Absoluta, ou como queira, Superalma;
4. Interpretação da
história como realização de um plano providencial no qual os povos vencedores
encarnam, alternadamente, o Espírito do mundo, ou seja, a Autoconsciência ou
Deus e;
5.
Interpretação do Estado como encarnação ou
manifestação do Espírito do mundo ou, em outros termos, como realização de um
Deus no mundo (ABBAGNANO, 2003).
[3]
Síntese da Dialética:
01.
Em Sócrates é o
processo que permite, por perguntas e respostas, refutar os oponentes expondo
as contradições e as dificuldades das suas posições.
02.
Para Platão, a
dialética é o processo que permite remontar, a partir de hipóteses, de ideia
em ideia até à ideia de Bem.
03.
Aristóteles
considera a dialética o estudo dos raciocínios que, ao contrário dos
demonstrativos, partem de premissas somente prováveis.
04.
Síntese (Platão
e Aristóteles): Platão mostrara a deficiência do conhecimento sensível como
mera opinião e se elevara ao mundo das ideias. Já Aristóteles acrescentou o
caminho para relacionar cada
coisa particular ao conceito universal.
05.
Entretanto, para Hegel, as ideias platônicas e os
conceitos aristotélicos ficaram, por assim dizer, bloqueados em rígida quietude
e quase solidificados. Hegel afirma que enquanto a metafísica utilizava noções abstratas e absolutas para explicar a
realidade estática a partir de suas essências imutáveis, a lógica dialética
parte do princípio de contradição, segundo o qual a realidade é essencialmente
processo, mudança, devir.
06.
Kant chama
dialéticos a todos os raciocínios ilusórios e define a dialética como uma lógica
da ilusão. A “Dialética Transcendental” é o estudo das ilusões
(paralogismos e antinomias) em que a razão cai quando
aplicada para além dos limites de toda a experiência possível.
07.
Os idealistas alemães veem na dialética uma noção
triádica, constituída de tese, antítese e síntese, que Hegel pensa
constituir o processo histórico necessário ao desenvolvimento do espírito e Marx
da matéria. Usa-se também a expressão “dialética argumentativa” para referir o
modo como se desenvolve a troca de argumentos numa discussão.
[4]
Segundo Feuerbach a religião é a cisão
do homem consigo mesmo: ele se põe diante de Deus como um ser contraposto. Deus
não é o que é o homem, o homem não é o que Deus é. Deus é o ser infinito, o
homem é o ser finito; Deus é perfeito, o homem imperfeito; Deus é eterno, o
homem temporal; Deus é onipotente, o homem impotente; Deus é santo, o homem
pecador. Deus e o homem são extremos: Deus é polo positivo, a soma de todas as
realidades, o homem é o polo negativo, a soma de todas as nulidades.
[5] O materialismo
pode ser esquematizado da seguinte maneira:
1.
Materialismo é a teoria
segundo a qual toda a realidade é de natureza material ou redutível a processos
de natureza material: a única causa das coisas é a matéria.
2.
O Materialismo se contrapõe ao idealismo por
negar a existência de estados mentais independente desses processos. Em outros
termos, ele nega a existência da alma
ou da substância pensante cartesiana,
bem como a realidade de um mundo espiritual ou divino cuja existência seria
independente do mundo material. O próprio pensamento teria origem material,
como um produto dos processos de funcionamento do cérebro.
3.
A
doutrina foi advogada pela primeira vez por Leucipo e Demócrito, filósofos
gregos do séc. V a. C., que viram naquilo a que chamaram átomos, juntamente com
o espaço, os constituintes de tudo o que existe.
4.
Os
filósofos atuais, no entanto, preferem falar de fisicalismo em vez
de materialismo, uma vez que a física moderna concebe a matéria como sendo
composta de protões, nêutrons e elétrons.
5.
O
materialismo é ainda importante como uma possível solução para o problema da
mente-corpo.
[6]a) O Materialismo Histórico, termo utilizado
na filosofia marxista para designar a concepção materialista da história. Uma interpretação
da história que afirma que não são as ideias em si, mas sim as relações
econômicas de produção, que constituem os agentes fundamentais da vida social,
política e espiritual do homem;
b)
Uma teoria (científica, segundo Marx) sobre a formação e o desenvolvimento das
sociedades humanas, que considera que a economia é a chave da compreensão dos
fenômenos históricos;
c)
Uma visão da história como processo dialético, dinamizado por uma série de
contradições que se dão essencialmente na estrutura econômica das diversas
sociedades.
[7]a) Entende-se
por materialismo dialético, a filosofia oficial do comunismo enquanto teoria
dialética da realidade (natural e histórica).
b)
Trata-se na realidade de um dialetismo naturalista, cujos princípios foram
propostos por Marx, desenvolvidos por Engels e depois, mais ou menos
servilmente, seguidos pelos filósofos do mundo comunista, que são os únicos
seguidores dessa filosofia.
[8]a.
O materialismo mecanicista
parte da constatação de um mundo composto de coisas e, em última análise, de
partículas materiais que se combinam de forma inerte,
b. O materialismo
dialético considera que os fenômenos materiais são processos. Além disso,
segundo Marx, o Espírito não é consequência passiva da ação da matéria, podendo
reagir sobre aquilo que o determina.
[9] “a mentira do
ideal foi até agora a maldição sobre a realidade; com ela a humanidade mesma se
tornou, até em seus mais profundos instintos, mentirosa e falsa - até chegar à
adoração dos valores inversos àqueles com os quais, somente, lhe estaria
garantido o prosperar, o futuro, o elevado direito a futuro” (NIETZSCHE).
[10] “Quem sabe
respirar o ar de meus escritos sabe que é um ar de altitude, um ar forte. É
preciso ser feito para ele, senão o perigo de se resfriar não é pequeno. O gelo
está perto, a solidão e descomunal – mas com que tranquilidade estão todas as
coisas à luz! Com que liberdade se respira! Quando se sente abaixo de si! –
filosofia, tal como até agora a entendi e vivi, é a vida voluntária em gelo e
altas montanhas – a procura por tudo o que é estrangeiro e problemático na
existência, por tudo aquilo que até agora foi exilado pela moral” (NIETZSCHE).
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